Área verde por habitante é insuficiente em São Paulo por causa da
especulação imobiliária, verticalização e política que privilegia o
transporte individual. Em Curitiba, onde os corredores de ônibus fizeram
parte do desenvolvimento da cidade, índice de área verde por habitante é
quatro vezes maior.
FOTO:DIVULGAÇÃO
FONTE:BLOG ÔNIBUS BRASIL
Quando se fala em desmatamento, logo se pensa na destruição de
grandes ecossistemas como a Amazônia e a Mata Atlântica. E realmente o
problema é preocupante. De acordo com o Global Forest Resources
Assessements, que é o indicador da ONU – Organização das Nações Unidas
para Alimentação e Agricultura (FAO – sigla em inglês) que monitora as
florestas no Planeta, o Brasil foi o país que mais perdeu área verde nos
últimos onze anos em todo o mundo. Ao todo foram perdidos 55,3 milhões
de hectares. De acordo com o Ministério do Verde e do Meio Ambiente,
restam apenas 7% do território original da Mata Atlântica.
Mas existe um outro grande problema que é pouco discutido e que pode
ser considerado de extrema gravidade em relação ao meio ambiente: a
perda de área verde urbana.
Dados da Prefeitura do Rio de Janeiro mostram que a área verde por habitante na cidade caiu 26% de 2011 para 2012.
Em São Paulo, de acordo com a prefeitura, no mesmo período, as áreas
verdes públicas por habitante caíram em nove das trinta e uma
subprefeituras da cidade, também entre 2011 e 2012.
Só na região do Jabaquara, a perda foi de 59,5%, onde o índice de
área verde por habitante caiu de 5,98 metros quadrados para 2,41 metros
quadrados. Em Pinheiros, a queda foi de 58,5%, passando de 5,26 metros
quadrados de área verde por pessoa para 2,18 meros quadrados.
Segundo a Sociedade Brasileira de Arborização Urbana – SBAU, órgão
reconhecido pelo Ministério do Meio Ambiente e formado por equipes
multidisciplinares, o índice mínimo de área verde recomendado por pessoa
numa área urbana é de 15 metros quadrados. São Paulo atingiu número
inferior: 14,58 metros quadrados. De acordo com a ONU, a cidade mais
verde do Brasil é Curitiba, com índice de 64 metros quadrados de área
verde urbana por morador.
E a comparação entre as duas cidades não poderia ser mais propícia.
A diferença entre elas se dá no modelo de crescimento urbano e na opção de política pública de mobilidade.
E essa diferença é a prova de que uma política que opte pelo
transporte público é essencial para a manutenção e recuperação de áreas
verdes urbanas que, além de melhorarem a qualidade do ar nas cidades, as
deixa menos impermeáveis e suscetíveis às enchentes.
São três os principais motivos para as cidades perderem área verde
1) Falta de planejamento urbano com crescimento desordenado
2) Verticalização das edificações, onde se concentra mais pessoas
numa mesma área e os terrenos perdem quintais e pequenas plantações
3) Privilégio ao transporte individual que usa mal o espaço urbano.
Em Curitiba, no ano de 1974, o então prefeito Jaime Lerner, ao
projetar os corredores de ônibus do tipo BRT (Bus Rapid Transit) não
apenas escolheu um modelo de mobilidade, mas um modelo de cidade, no
qual, as pessoas teriam prioridade e não os carros. O corredor de ônibus
acabou organizando fisicamente e conceitualmente o crescimento da
cidade.
Apesar de hoje a demanda de passageiros em Curitiba e na região
metropolitana exigir mais corredores, como a Linha Verde, que compactua
corredor de ônibus com ciclovias e áreas ajardinadas, o modelo é
considerado exemplo a ser seguido.
Já em São Paulo, apesar da existência hoje de uma tímida malha de
metrô e de corredores de ônibus de fato para a demanda e para as
proporções da cidade, a opção histórica foi o transporte individual. E a
população, com a perda de qualidade de vida e de saúde, tem pagado caro
por esta opção. Para se ter uma ideia, os hospitais estão lotados de
pacientes com problemas agravados pela poluição. Só na cidade de São
Paulo, cerca de 4 mil pessoas por ano perdem a vida por causa de doenças
ocasionadas ou agravadas pelos altos índices de poluentes, segundo a
USP – Universidade de São Paulo.
A frota de carros na cidade cresceu de forma vertiginosa, assim como a
população urbana. São Paulo foi o estado preferido pelas grandes
montadoras de automóveis.
E para receber uma população maior e uma frota de carros que
proporcionalmente cresceu cerca de dez vezes mais rapidamente que o
número de pessoas, muita área verde urbana foi perdida. Canteiros foram
transformados em mais faixas para carros. Leitos de rios viraram
marginais, que foram ampliadas, alargadas, mas que tempos depois se
tornaram insuficientes para a frota de carros. Prova disso foram as
pistas centrais da Marginal Tietê, que dois anos depois já tinham
perdido todo benefício que haviam proporcionado.
Isso porque existe um ciclo vicioso. Carros pedem mais vias e mais vias atraem mais carros.
A conta é simples. Um ônibus urbano convencional mede 13,2 metros de
comprimento e pode levar em torno de 80 pessoas. Um carro em média tem
4,07 metros de comprimento. Como na maior parte das vezes os carros
circulam só com o motorista e no máximo com mais um ocupante, seriam
necessários 40 carros para levarem a mesma quantidade das pessoas no
ônibus. Só que enfileirados, sem nenhum espaço entre eles, estes carros
em vez de ocuparem os 13,2 metros do ônibus usam 162,8 metros.
Um passageiro de ônibus ocupa 1,96 metro quadrado de espaço urbano e um motorista de carro ocupa cerca de 10 metros quadrados.
Essa brutal diferença faz com que, ao não priorizar o transporte
coletivo, se pedesse espaço que poderia ser de áreas verdes e para
convivência entre as pessoas. Hoje, as cidades têm se tornado lugar de
sobrevivência e não mais de convivência.
Além disso, os corredores de ônibus podem ser delimitados por
jardins. Entre a Capital Paulista e municípios da região do ABC, a
empresa Metra, concessionária do Corredor ABD – São Mateus / Jabaquara
criou em 2008 o Corredor Verde. Até agora já foram plantadas cerca de
cinco mil mudas de árvores, que neutralizam o carbono emitido pelos
carros ao redor do corredor. Parte da frota da Metra é também operada
por veículos não poluentes, como os trólebus, ou que poluem menos, como
os ônibus elétricos híbridos.
FOTO:ADAMO BAZANI
O poder público também deveria, de acordo com especialistas, criar
normas para que o cidadão participe de forma mais ativa na recuperação
do verde urbano. Parece que não, mas se cada uma das milhões de
edificações em São Paulo ao menos tivesse um jardim de três metros
quadrados, isso faria uma enorme diferença no conjunto para a cidade.
E voltando à questão inicial do desmatamento dos grandes
ecossistemas, eles só existem para servir ao crescimento irregular e às
políticas arcaicas e equivocadas das cidades.
Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes
Nenhum comentário:
Postar um comentário